Neopositivismo: a ciência burguesa

Neopositivismo: a ciência burguesa

A gênese da ciência

Identidade própria e conflito com a religião

Até a Antiguidade Clássica, portanto, a tendência de refletir a realidade como ela é em si, desantropomorficamente, esteve de forma indiferenciada junto ao reflexo religioso. Este, ainda que com traços diferentes daquele mágico primitivo, atribuia à realidade um caráter transcendente.

Só na Grécia Antiga, como diz Lukács, é que o reflexo científico de fato adiquire sua identidade própria. Por muitos motivos que não comportam aqui, somente com os gregos clássicos é que se desenvolve uma metodologia científica própria. Esta torna possível a generalização dos conhecimentos imanentes do mundo. Todavia, é só com o advento do capitalismo que a ciência passa de fato a ser a forma de reflexo predominante. Da Antiguidade Clássica até a superação do mundo feudal, ciência e religião travaram conflitos memoráveis. Podemos exemplificar essas lutas na perseguição da Igreja Católica Apostólica Romana a Copérnico, Giordano Bruno e Galileo.

Nesse contexto, perante inegáveis achados do reflexo científico e suas repercussões no cotidiano, a religião representada aqui pela Santa Sé, admitiu a dupla verdade. A individualidades que melhor representavam os avanços científicos, recorrem a Teoria da Dupla Verdade como forma de garantir a própria integridade física.

Predomínio da ciência e capitalismo

Com a queda do Antigo Regime e o predomínio do capitalismo, assistimos uma situação inversa. Agora é a religião que lança mão da dupla verdade como meio para manter posições em um mundo predominantemente guiado pela ciência. Porém, a burguesia precisa da ciência e de desenvolvê-la para poder garantir e ampliar sua reprodução. Ao mesmo tempo, como classe dominante precisa restringir o acesso ao que há de mais avançado em termos de conhecimento científico. Surge então, a partir das contradições da nova sociedade, uma ciência comprometida não imediatamente com a imenência do mundo, mas com os interesses do capital. Lukács, ao que nos parece, toma o neopositivismo como melhor exemplo dessa situação.

Contraditoriamente, o reflexo científico da realidade sempre tende ao desvelamento do real como ele é em sua imanência, ou seja de forma desantropomórfica. Assim, apesar dos esforços em negar a ciência para a classe trabalhadora, esta acaba se apropriando pelo menos de parte das descobertas da ciência. Isso explica ainda outro fato. Mesmo o capital promovendo uma educação voltada para o atendimento de necessidades mercadológicas, nem sempre o resultado é positivo. Nem todos que passam pelo processo educativo viram imediatamente mão de obra numa fábrica. Alguns se tornam filósofos e/ou artistas, nas mais diversas possibilidades de manifestação estética.

O neopositivismo, portanto, expressa segundo Lukács o padrão de ciência da burguesia. Por negar a realidade em sua imanência, o neopositivismo possibilita todo tipo de manipulação do real, inclusive aquela de tipo religioso-teológico. Não é por acaso que muitos autores atualmente celebram o retorno do religioso que, segundo eles, tem se dado pela perda de confiança na ciência. De fato, o fenômeno religioso tende a ganhar espaço num mundo em que a ciência que prevalece nega o status ontológico da realidade. Seja essa prevalência dentro ou fora da academia.

Desse modo, só podemos considerar e entender a aclamação do retorno do religioso de forma séria se colocada nesse contexto. Não é pela falha do reflexo científico, mas pela manipulação de seus resultados operada pelo modo de produção atual que faz surgir um espaça de manobra propício para a religião. Essa manipulação é, segundo depreendemos de Lukács, condensada teoriacamente em abordagens neopositivistas.

O padrão científico burguês, ou seja, o neopositivismo, atende muito bem as exigências do mundo do capital. A burguesia precisa operar todo tipo de manipulação da realidade, inclusive por via das mais variadas ciências particulares sob o manto neopositivista. Só interessa para o capitalismo fazer avanços na ciência quando estes significam alguma possibilidade de expansão dos lucros. Quando não é essa a situação, o capital só permite aos trabalhadores “se virarem” com toda sorte de distorção e mistificação da realidade, inclusive as religiosas.

O combate que precisamos fazer

Está claro que tal ciência burguesa impõe limites para a plena realização inclusive da ciência, e ainda mais no sentido da realização plena das potencialidades humanas. Escolas, universidades e instituições de ensino em geral, incluindo aqui as particulares, são promotoras desse tipo de pensamento científico. Consequentemente, devemos combater diariamente uma escola que promove uma “ciência” que nega a realidade, a imanência do mundo. De igual modo, precisamos severamente criticar uma universidade que defende, legitima e forma com base num padrão científico que mistifica o mundo, que o toma de modo antropomórfico adimitindo sua transcendência.

Por fim, a ciência burguesa da burguesa, do capitalismo, ou seja, o neopositivismo, não atende as necessidades reais da classe trabalhadora. Devemos combatê-la e reivindicar uma ciência assentada em bases ontológico-materialistas, cujo compromisso seja com a imanência, com o em-si do mundo, e não com o lucro. Todavia, para que prospere tal ciência, antes temos que suplantar o capitalismo.

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